A palavra democracia significa o
governo do povo. A democracia na antiga Grécia era
exercida na praça pública ou “mercado”, lugar em que “todos” discutiam sobre a
administração da pólis. Deste modo, a democracia
era compreendida como ação política em que homens livres procuravam o consenso
e o dissenso perante as questões administrativas dentro das subdivisões (cidade-estados)
de terras em que eles viviam.
É importante
salientar que a democracia nasceu com a liberdade do homem, esse homem
precisava ter posses e condições de laborar sobre a terra, ou seja, os
indivíduos que conseguissem administrar a família, a propriedade da família, a
casa, poderia participar da
Eclésia (assembleia). Por outro lado os homens
que não tinham condições mínimas de manter a oikos não participavam das
assembleias.
A mulher, a
criança e os escravos (prisioneiros de guerras) na Grécia antiga não tinham
espaço na àgora (praça, mercado), pois
a administração da pólis
era exercida por homens que “sabiam cuidar de si e dos outros”. As mulheres por
serem consideradas pelos homens da época entes que precisavam aprender a lidar
com cuidado de si e da casa não constituíam a assembleia dos homens. Sem
cometermos anacronismos
que é a capacidade de atribuir à ideia de uma época para outra, podemos
compreender que a democracia na sua origem surgiu com certas “limitações”.
A característica
maior da democracia grega era a participação ativa do homem livre para elaboração
de regras de condutas para condicionar e serem condicionados pelas mesmas. Os homens
livres podiam participar das discussões na ágora e as reuniões deveriam ser públicas,
ou seja, serem visíveis para todos os homens “ditos livres” para usarem o consenso
ou dissenso. Por incrível que pareça desde a democracia Grega Antiga até a
chamada democracia moderna muita coisa mudou ou será que se inveterou para
outras conotações ou dissimulações?
Pensar a
democracia moderna segundo Norberto Bobbio é atinar para o conjunto de regras e
normas para lidar com as demandas da cidade. Mas pensar a democracia é também
atinar para como fazemos política e como estamos fazendo política, todavia para
refletir sobre isso devemos recorrer ao primeiro escritor que tratou a política
de forma autônoma e “distanciada” das questões religiosas.
Maquiavel
italiano natural de Florença escreveu a obra O Príncipe, nesse livro a política
é compreendida como relação de poder, um campo de relações.
Com efeito, podemos
entender a política como conquista pelo poder. A política terá em seu centro sendo
utilizado o uso de estratégias, táticas, técnicas para manter-se no poder e/ou como
usar a força para lidar com as revoluções sociais. Por outro lado, uso da força
pelas revoluções sociais para tirar grupos estabelecidos que usem o Estado para
manter suas convicções que podem ferir questões relacionadas às dimensões
humanas nos aspectos: políticos sociais, econômicos, psicológicos, socioculturais.
DO século XIX ao
XX entraram em pauta as repercussões históricas dessa forma de fazer política
do ocidente. O uso da violência se for possível para alcançar objetivos, a
paixão emocional política pela vitória, pelo gozo de dominar e fazer valer os interesses
políticos culminaram com o advento da Segunda Guerra Mundial, essa será o ápice
visível de tensões no espaço-tempo das pretensões e escolhas políticas pelo
poder. Perceba, não adianta dizer que as escolhas políticas entre os séculos
XIX e XX foram feitas de forma não democrática, ou diríamos: Falta de liberdade
e de refletir sobre suas escolhas, ao
contrário como diria Hobsbawm o século XX é a era das tensões dos sistemas
preestabelecidos, como a oscilação entre o estado mínimo e estado social,
burgueses e proletariado, desiguais e iguais, os estabelecidos e os de fora.
Caro leitor, saliento
que a Segunda Guerra Mundial não deve ser entendida só entre choques externos
entre Estados Nações, mas compreendida como tensões ocasionadas pelas
concepções de políticas ocidentais que sempre tiveram e quiseram manter-se os
seus ideários de desenvolvimento, modernidade, civilidade. Essas concepções se
tornaram danosas ao longo do tempo e mais perigosas utilizando-se da democracia
que é frágil em seu ideário de “visibilidade ou transparência do poder” (BOBBIO,
2000, p.21). Entretanto, democracia que nasce com o sinônimo de liberdade e ao
mesmo tempo mantém a sua estrutura social sem nenhum tipo de mudança na
mobilidade social na divisão do trabalho social.
Com efeito, o
leitor pode perguntar-se: “Por que rememorar algo que já foi superado”? Mas
será que superamos a forma como o ocidente fez e faz política, e usa a
democracia como espaço de barganha para interesses políticos? Um bom exemplo
são as escaladas subidas do uso de armas biológicas, conflitos geopolíticos na
atualidade, demagogias às claras. É necessário perguntar-se, se de fato a política
é a realidade do poder pelo poder, como diria Weber uma empresa, e se a
democracia é o governo do povo e/ou espaço de bajulação, barganha. Ou podemos
ver a política e a democracia como sinônimos da superação humana em lidar com a
condição humana e com o que nos condiciona como diria Hanna Arendt.
Se a política e
a democracia são compreendidas como sinônimos de poder pelo poder, lugar de
bajulação para adquirir mobilidade social e “outras coisas” realmente pode-se
dizer que o homem e a mulher como construções sociais estão à beira do abismo,
precisando de transvaloração das concepções de política e democracia que se
preestabeleceram e estão nos levando ao sem sentido, sem significado, vazio que
nos levará como muitos diriam: “idade das trevas”, mas acredito nas criticas de
Max Weber que na sua conferência sobre Vocação Política nos indica que “o homem
usa da política como empresa, briga e controle de empregos, gozo pela simples
posse pelo poder” (WERBER, 2008, p.65).
Por outro lado, Marx
Weber também nos indica que há o político que vive da política por querer:
“encontrar um equilíbrio interno colocando-se a serviço de uma causa que dar
significado a sua vida” (WEBER, 2008, p.67) ao contrário daquele que vive para
a política e de certa forma se tornando um tecnocrata, político que só usa de
técnicas racionais se esquivando dos aspectos humanos, sociais e culturais. O
político que vive da política e que ver na política ponto de unidade para sua
vida ou como diria Weber como ponto de
equilíbrio para sua vida pessoal, esse seria o ideal, mas acredito que ainda
não o temos, ele aparece mais como vislumbres, em eterna construção e quem sabe
em uma futura geração aparecerá para lidarmos com a complexidade das nossas questões
atuais referente à política e a democracia.
O fato é:
vivemos em condições reais, e pensar as condições reais, é lidar com o aqui e o
agora. Atinar para as tensões na sociedade usando a mudança de mentalidade para
lidar com as repercussões do passado para as concepções do presente. Perceber
se realmente estamos conscientes perante as questões políticas ao nosso redor e
olhar para a democracia como algo que precisa de condições sociais necessárias
para sua efetivação. Compartilho a ideia do Jus filósofo Norberto Bobbio que indica
a importância de não só aumentarmos o numero de participantes, mas aumentar os
espaços para exercermos os direitos conquistados. Pois, a democracia a atual a
que temos tornou-se limitada com seu caráter tecnocrata, onde os políticos
representam burocraticamente interesses múltiplos, mas não o reflexo das
tensões da sociedade civil aqui entendida como espaço de tensões de interesses
que quer trabalhar e substancializar os interesses sociais, culturais.
Todavia só
poderemos fazer valer os interesses da sociedade civil como foi dito,
aumentando os espaços e exercendo os direitos conquistados e fazendo com que os
novos espaços pautem e efetivem ação referente às novas demandas sobre as
questões sociais. É necessário além de aumentar espaço, diminuir a distância
entre os espaços, algo que não vem acontecendo porque os que sempre aparecem
nos espaços são os convocados, esses que são os partidários, os quais já
perderam a conexão com a sociedade civil. Temos uma democracia que de certa
forma substancializou formalmente direitos na constituição brasileira, porém precisamos
fazer valer e efetivá-los, positiva-los no nosso dia-a-dia e não só na lei, mas
na forma como nos comportamos em relação a questões: étnicas raciais de gênero
na complexidade a qual vivemos na cidade.
Assim, poderemos
ter em nossa frente à concepção de que precisamos sim respeitar, uns aos outros
mutualmente sem distinção seja ela qual for, para isso ratifico que precisamos
de reformas, ressignificações na nossa forma de fazer a democracia e a política,
mesmo nessa política tecnocrata que temos e ainda vamos viver nela por um longo
tempo até chegarmos perto do vislumbre que Max Weber nos pauta sobre indivíduos
políticos que olhem para a política com o sentido de vida, causa e responsabilidade
para o bem da cidade e do individuo.
Referencias:
BOBBIO, Norberto.
O Futuro da Democracia. 10 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.207p
WEBER, Max.
Ciência e Politica: Duas vocações.15 ed São Paulo: Cultrix,2008.124p