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" O DIÁLOGO. É O ELO QUE FALTA "

FILOSOFIA: ESPAÇO E TEMPO COMO DETERMINAÇÃO DA COISA NA FILOSOFIA HEIDEGGERIANA



Introdução: O que é uma coisa?



Partindo da análise heideggeriana da determinação da coisa baseado em “O que é uma coisa?” um texto publicado em 1962 e que tem por base o Curso do Semestre de Inverno de 1935/1936 dado pelo autor na Universidade de Freiburg, utilizarei aqui a parte preparatória onde Heidegger analisa os diferentes modos de questionar acerca da coisa, focando na questão espaço e tempo como determinação da coisa na filosofia heideggeriana.

        A questão acerca da coisa é muito antiga, mas ao questioná-la faz-se brotar sempre algo novo, pois a coisa sempre está posta. Precisamente, como diz Heidegger o cito na época das concepções de mundo: Heidegger quer assegurar o que foi posto, assegurar tem que ser um calcular, pois somente calculabilidade garante a certeza de antemão e do modo constante a respeito daquilo a ser representado. Verdade vem a ser a validade dessa representação. Logo, faz-se necessário  perguntarmos  acerca da “coisa”, isso  nos  remete a uma dúvida terrível, e percebemos que não podemos começar do nada ou do acaso, comitantemente também não podemos ficar somente olhando para o céu, a procura de “estrelas escondidas”, sendo que a coisa está abaixo do nosso nariz (HEIDEGGER, 1987, p.14).
A questão que nos traz Heidegger, não se pode começar com questionamentos acerca do espaço e do tempo, mas apenas da indagação “o que é a coisa?”. O primeiro a falar da palavra ou termo acerca da coisa foi Protágoras com sua máxima que nos foi legada: “o homem é a medida de todas as coisas, das que são enquanto existem, e das coisas que não são, enquanto não existem”. Neste contexto, Protágoras não estava querendo colocar como centro  a coisa, mas sim, o homem como padrão de julgamento e critério fundamental que determina  a coisa.
Desta maneira, postulamos primordialmente que a concepção da coisa tem múltiplos significados, nela tendemos a uma coisa, podendo ser uma caneta, uma pedra ou um pedaço  de madeira, como qualquer objeto que ocupe lugar no espaço. Porém, já não temos certeza quando falamos em um número, visto que não temos como experimentar pelos sentidos e determina-lo como uma coisa, assim como um local incerto, escolhas, etc. (HEIDEGGER, 1987, p.16).
Heidegger faz uma analogia da coisa com a antiga palavra alemã (Thing) como “discussão de um processo, discussão em geral, assunto; tal como quando tomamos as coisas claras, ou quando o ditado diz: uma coisa boa tem o seu tempo próprio” (HEIDEGGER, 1987, p.16). Esse processo leva Heidegger a conceber dois sentidos para a coisa, o sentido restrito e o sentido lato. O sentido restrito é o disponível, o visível, o evidente. No sentido lato é qualquer coisa que aconteça de um modo ou de outro, as coisas que se passam no mundo, acontecimentos, eventos (HEIDEGGER, 1987, p.17).
Heidegger cita Kant, pois na Crítica da Razão Pura ele trata da coisa, mas da coisa em si, que esta vinculada as coisas além da sensibilidade humana, ou seja, não é mais a pedra, não é mais o cavalo, nem uma planta, mas sim uma coisa absoluta que o homem não tem acesso pela experiência. Percebemos então, que coisa em Heidegger tem a ver com algo que existe mesmo e que seja determinado, simultaneamente a coisa é totalmente o contrário do nada, que não é ente e nem objeto.
Logo, não podemos experimentar o conceito de Deus e muito menos o próprio Deus, cabe aqui entender Deus como uma coisa, assim como um X ou um Y, comitantemente que um número, a fé, honra, lealdade, fidelidade que é qualquer coisa. Deste modo, recorremos a perguntar o que é a coisa? Mas, perguntando também que coisa? Devido a isso, percebemos que essa formulação é mal empregada, pois quando questionamos pela caneta, onde está a caneta? A caneta minha ou a sua, ou de outra pessoa em outro local, desta maneira continua indeterminado a questão da coisa.
Para tal intento, Heidegger afirma que nesta questão chegamos tarde em saber o que é a pedra, a flor ou o cavalo, porque já temos áreas nas ciências que estudam sobre essas coisas, mas Heidegger quer saber o que é a pedra enquanto coisa. De sorte que, avançamos apenas para saber o que é a coisa, esses objetos são meios necessários para chegarmos a coisalidade da coisa, logo nunca saberemos a coisalidade da coisa sentado em casa no sofá assistindo televisão, mas sim em locais de trabalho de investigação ou em oficinas. Através das coisas que chegaremos num condicionado, num fundamento sólido, pois quando vemos a coisa, queremos saber o que esta por de trás daquela coisa, ou seja, a coisalidade da coisa, um fundamento sólido, um solo (HEIDEGGER, 1987, p.20).

Metafísica como além daquilo que conseguimos apreender



O botânico, o geólogo, o mineralogista, o zoólogo, todos eles se especializam  e quando vão estudar determinada coisa buscam primordialmente o progresso da ciência ou buscam novas descobertas, mas a coisa que eles querem difere no que a ontologia heideggeriana busca, aqui queremos apenas saber um pouquinho mais acerca da coisa, sendo que nosso saber não é nem menor nem maior que o saber da ciência, só compreendemos um pouco diferente do que a ciência compreende e diferente do que domina as concepções de mundo.
Então, nesta perspectiva Heidegger quer chegar, na verdade, no que determina a coisa ser coisa, questionando, experimentando e determinando uma possível possibilidade de estabelecer algumas considerações previas de como se pensa esta noção. A coisa é um questionamento que surge no âmbito radical acerca dos surgimentos de projetos de mundo em geral. Ela aponta para certos acontecimentos históricos que não transformam somente dimensões da vida, de indivíduos ou grupos singulares, mas instauram modos de relação entre o ser e o homem e o ente na totalidade. A percepção deste acontecimento heideggeriano,  não nos leva muito longe, porque estamos cheios de questionamentos metafísicos da coisa, uma vez que rapidamente nos vemos confrontados com uma proliferação de conceitos que não possuem nenhuma clareza imediata. Quando ficamos dispersos com informações incessantes sobre certas dimensões particulares do todo, mas se pensarmos historicamente, isso significará para nós pensar o acontecimento mesmo dessa unidade vinculadora desses acontecimentos de uma época. Todos os renascimentos historiológicos não passam de fachada para equívocos históricos. Heidegger quer que nos movimente pelo viés histórico, ou seja, com aquilo que acontece naquela época.
Mundo significa ente na totalidade, e como tal o ser aí se coloca e o põe como ente. Concepções de mundo quando Heidegger comenta, significa que o mundo vem a ser o repertório de significado e sentidos para designar o surgimento dessa medida vinculadora simples que instaura uma época.
Antes de prosseguimos vamos abrir um parêntese no nosso diálogo e vamos falar da nossa experiência cotidiana, de uma coisa já sabemos nós como sujeitos, e eus individuais, somos influenciados pela sensibilidade e trazemos em nós apenas imagens subjetivas, as coisas próprias da coisa, não alcançamos. Heidegger vai dizer que mesmo quando a experiência cotidiana tem em si uma verdade, ela deve ser apresentada e fundamentada para ser assumida enquanto tal (HEIDEGGER, 1987, p.27).
É por isso, que para todas as coisas há um duplo, Heidegger (1987, p. 24) cita o exemplo do pastor de ovelhas:
O pastor de ovelhas vê o sol se pôr todos os dias e acha que o sol que girou em torno da terra, percebe-se o problema do que é uma aparência, pois o sol não se põe, mas naquele momento que ele desce aparentemente, ele está em outro espaço como por exemplo o sol de meio-dia em um determinado lugar. Logo, o sol do pastor difere do sol do astrofísico, pois o sol pertence a um sistema que denominada de Via Láctea e que é de uma dimensão muito maior. Desta maneira, que sol que é verdadeiro, é o sol do pastor de ovelhas ou do astrofísico? Para isso, é necessário dividir o que é uma coisa e o que significa ser coisa e como se determina uma verdade de uma coisa.

Para isso diz Heidegger, temos que tomar uma posição frente a nossa experiência cotidiana para que haja uma verdade fundamentada. Na experiência cotidiana sempre estamos nos deparando com “coisas singulares”, ou seja, pedra, cadeira, mesa, entre outros diversos objetos, além disso, precisamos dizer que a pedra é, a cadeira é, a mesa é, sempre objetos já determinado, concluímos provisoriamente que não há nada em geral, mas sim coisas ou entes singulares e essa singularidade é que faz cada coisa ser ela mesma e não outra coisa.

O que é espaço e tempo?



Essa interrogação acerca da determinação da coisa nos leva a fazer outras questões: O que é o tempo? E o que é o espaço? Percebemos que isso na filosofia heideggeriana é  familiar, mas o autor questiona ainda por que o espaço e o tempo estão unidos um ao outro através de apenas um “e”, Heidegger entende que quando colocamos esse “e”, parece que estamos colocando o espaço e tempo como cão e gato. Assim, para estabilizar essa questão Heidegger prefere chamar a questão de espaço de tempo, e o determina como uma porção de tempo, por exemplo, o espaço de tempo de 100 anos, delimitando o tempo e espaço para compreender a temporalidade.
Logo, nesta questão o que é a coisa? Inclui a questão do espaço de tempo, na qual como se determina, segundo parece, que consiste ser esta coisa. Com isso, uma coisa é essa coisa e não pode ser outra, por mais que sejam idênticas, ser esta coisa é está em conexão no espaço e no tempo. Isso nos indica que o lugar e o momento de tempo mostram precisamente que as coisas se encontram aqui ou ali.
Percebemos até aqui, que espaço e tempo são exteriores a coisa. Heidegger  exemplifica essa situação com um pedaço de giz, um pedaço de giz ocupa um espaço, o pedaço de giz é extenso, este espaço está simplesmente ocupado, preenchido. O interior do giz consiste em espaço, dizemos que ele ocupa e encerra em si mesmo através da superfície,  como se ele fosse um mero interior. Quebramos o giz em dois pedaços, encontramos agora com seu interior? Tal como antes estamos no exterior nada se modificou. No momento que quebramos o pedaço de giz, através de um corte queremos agarrar seu interior, até que o giz tenha se transformado em pó totalmente. Através de um microscópio podemos ver minúsculos grãos, mas não encontramos nada no que respeita ao “quê” (essência). Continuamos o desmembramento podemos chegar até a estrutura atômica das moléculas, mas tomando o caminho da química e física, ele nos conduz apenas no domínio “mecânico”, além de uma porção de espaço em que qualquer coisa material repousa num lugar. A física atômica de Niels Bohr em 1913 estabeleceu seu modelo atômico e as relações de matéria e espaço, verificando que não são nada simples, para Bohr o que situa num lugar e ocupa espaço deve ser, ele próprio, extenso. A questão que Heidegger propõe era saber como se observava o interior dos corpos extensos e o resultado que ele tirou disso foi que o interior, diz ele continua a ser um exterior para os corpos, por menores que se tornem como nosso giz, resultou em um monte de poeira (HEIDEGGER, 1987, p. 29).
O giz ocupa apenas um espaço, nada mais além que isso, e espaço é o limite que  separa o interior do exterior, o interior é o exterior recuado, somente o tempo é exterior as coisas, o giz também tem seus tempos, momentos de tempos, ora está aqui e ora está ali, agora é grande, no futuro é pequeno ou transformado é um monte de poeira, para Heidegger o  tempo é uma questão de significância, de forma que sabemos que com o passar do tempo as coisas se alteram, consideramos a contagem do tempo no relógio, mas onde está o tempo? Olhamos e vemos ponteiros se movimentando, mas onde está o tempo? Abrimos o relógio e buscamos pelo tempo e não encontramos o tempo. Se cada coisa é esta coisa no espaço e no tempo, então introduzem enquanto argumento que o tempo é uma sequência de “ágoras”, que atualiza a cada momento o agora a coisa.

Considerações finais



Resultado, uma coisa para Heidegger é um suporte subsistente de diversas propriedades, que nela subsistem e se modificam. Percebemos que essa resposta resulta perfeitamente da experiência cotidiana, onde há um sujeito e um objeto, isso é natural, e é nesse natural que Heidegger caminha para a designação da coisa, é por si mesmo e compreensível no cotidiano. Essa naturalidade da coisa tem sinal histórico, pois sempre que compreendemos preliminarmente a coisa, alguém compreendeu anteriormente a  coisalidade da coisa com uma tradição histórica. Esses acontecimentos históricos que não transformam apenas dimensões da vida, de indivíduos, ou grupos singulares, mas que instauraram novos modos de relação entre o ser humano e o ente na totalidade. A percepção deste horizonte do conhecimento acerca da coisalidade da coisa nos coloca confrontados com a proliferação que não possui nenhuma clareza. Dizer que há uma ligação essencial entre a coisa e os surgimentos históricos de projetos de mundo permanecem uma informação a ser investigada, enquanto não sabemos o que significa um projeto de mundo e o que o distingue de um acontecimento histórico.
Entendo história no aspecto da questão, como o correlato do processo de sedimentação das visões de mundo, ou seja, ela está muito próxima da visão de mundo em Dilthey. História é o processo paulatino de constituição de significação e sentidos, a partir dos quais o ser ai se orienta nas suas realizações, em um determinado momento vai ser um termo para designar o surgimento de uma medida ontológica que vincula todos os acontecimentos de uma época.
Acontecimento apropriativo é o ponto que perscruta a si mesmo e aponta para o interior desse meio que o pensamento precisa se conduzir para toda essenciação da verdade do ser. Em primeiro lugar não conseguiremos perceber como Heidegger pensa essa noção. Acontecimento apropriativo é algo que surge no âmbito radical acerca do surgimento de projetos de mundo em geral.
Heidegger aponta para o modo que procura caracterizar acontecimentos históricos que não transforma apenas dimensões da vida, de indivíduos, ou grupos singulares, mas que instauraram novos modos de relação entre o ser humano e o ente na totalidade. A percepção deste horizonte do conhecimento apropriativo, quando nos vemos confrontado com proliferação que não possui nenhuma clareza. Dizer que há uma ligação essencial entre acontecimento apropriativo e os surgimentos históricos de projetos de mundo permanecem uma informação vazia, enquanto não sabemos que significa um projeto de mundo e o que distingue um acontecimento histórico.
Creio que esse problema seja superado com a hermenêutica e a fenomenologia, utilizando como método de interpretação das concepções de mundo.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



HAAR, Michael. Heidegger e a essência do homem. Tradução de Ana Cristina Alves. Lisboa: Instituto Piaget, 1990.

HEIDEGGER, Martin. Que é uma coisa? Lisboa: Edições 70, trad. Carlos Morujão, 1987. INWOOD, Michael. Dicionário Heidegger. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.


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